Como sobreviver nesse mundo





Para sobreviver nesse mundo você precisa acima de tudo ter. Ter, ter, ter. Você precisa ter dinheiro, um ótimo emprego, ter muitos “amigos”, ter muita importância na sociedade, ter um carro do ano, ter um ótimo apartamento (na zona sul de preferência). É isso mesmo. Precisamos ter: do bom e do melhor – não necessariamente nesta ordem – para mostrarmos ao mundo que não somos fracassados, que somos abençoados, que “Deus ajudou quem cedo madrugou”.

Depois de você “ter” algo, você precisa “ser”. Você precisa ser lindo, maravilhoso, charmoso, bem vestido, hipócrita, ser descolado, ser o melhor, ser competitivo, ser egoísta, ser cara de pau, ser alguém que os outros querem que você seja. Você não pode ser você. Você tem que ser de acordo com as regras pré-escritas antes mesmo da sua chegada ao planeta. Se você – em algum momento insano da sua vida – resolver ser você mesmo. Ferrou. Já era. Esse mundo vai te engolir sem mastigar. Vai ser rápido, rasteiro. Então, sobreviva. Não seja você. 

Depois de você “ter”, “ser”, você precisa “fazer”. Faça qualquer coisa, algo que dê dinheiro para você e para os que te cercam. Não pode ser bondade, caridade, visita em asilo. Nada disso. Você tem que produzir. Fazer ganhar dinheiro. Fazer o mundo girar. Fazer acontecer. Essa é a realidade. Não adianta você fazer alguém parar de chorar. Não adianta você fazer alguém se sentir melhor. Você precisa – de acordo com as regras – fazer dinheiro. Não pode ser “gentinha”, morar no subúrbio, ganhar salário mínimo, nem ser inocente em achar que um dia as pessoas do business world vão te valorizar pelo que realmente você é.

É assim. Texto amargurado, não? Mas é isso. A realidade é essa. Você não pode mais ser a bondade em pessoa. A intelectualidade em pessoa. Não importa quantos livros você já leu, ou o quanto você sabe, um dia você vai entender que a melhor coisa é dar uma de burro. A vida é essa e pronto. Restaurantes caros, salões de beleza caríssimos, SPA, tem que ter mil mulheres, mil homens para estar dentro dos padrões “globais” e reais.  Não precisa ler mil livros, porque o que atrai o sexo oposto é a sua aparência: sarada, bem vestida. Ler pra quê? E sai fora os quilinhos a mais, desista, vá fazer uma dieta porque não rola, tem que ser magra, sarada, gostosa.

Nunca demonstre seus sentimentos. Por mais bonito que seja seu amor, por mais ardente que seja a sua paixão. Não fale nada. NADA. Como já disse Caio Fernando de Abreu "Nunca, jamais diga o que sente. Por mais que doa, por mais que te faça feliz. Quando sentir algo muito forte, peça um drink.". Não seja bobo, não seja boazinha. Não seja amoroso, formoso, carinhoso. Seja forte, rebelde, cruel, imponente, poderoso. Tenha o poder em suas mãos. E assim, se algo der errado, coloque a culpa no outro. Aliás, nunca erre. Essa é a regra. Não erre. Seja perfeito, ou pelo menos, finja ser.

Sobreviva. Vá em frente. Aos trancos e barrancos. Tenha. Seja. Faça. E se não conseguir. Ligue o seu computador e chore: por não ser tão hipócrita, tão lindo, tão maravilhoso, tão burro, tão perfeito, tão rico, tão poderoso. Chore por não conseguir ser falso, mentiroso, por ler vários livros, por procurar estudar, trabalhar honestamente, por morar no subúrbio, por comprar roupas na promoção. Chore muito. Escreva um  texto mais ou menos, publique no seu blog. Depois vá dormir, e deite tranqüilo, por não fazer parte dessa grande sujeira que o mundo se tornou.